o fone ia estourando os tímpanos enquanto o ônibus lotado encaminhava-me pra o lar-doce-lar. batia um vento vindo da janela de um céu de fim de tarde de um falso inverno que me fizera suar durante todo o dia, foi quando olhei no relógio e vi que o agosto escorregou por entre os dedos e pensei em nós, sobre esse um ano que diz muita coisa. diz que eu sobrevivi daquele agosto tenebroso. que foi a palma da sua mão sobre a minha num aperto quente andando desvairados numa avenida quase deserta, que me fez levantar da imensa escuridão em que eu me encontrava. ou me perdia. ou não sei. uma escuridão que me engoliu por muito tempo. o meu coração doeu por muito tempo, por ter sido apunhalado por mim mesmo. e foi nos maços de cigarro e no gosto bom(?) do álcool barato que ele se viu remediado, mal sabia quanto amor havia num sorriso que iluminaria toda essa cidade escura. e foi nessa mesma noite, que eu vi na beira do abismo uma chance. uma única chance de sobreviver mais de demasiadamente eu mesmo do que do mundo, se bem que é nessa metafísica do espelho que se vê quanto o mundo está intrincado em você, como uma cicatriz. eu sobrevivi ao meu próprio veneno, corda ou lâmina e entreguei a você, o direito de determinar um caminho pra mim. enlouqueci por um tempo, disse em voz alta o quão louco estava como numa auto-terapia fajuta e no auge dessa loucura me senti curado, da possessividade e da minha impossibilidade de ter em mãos a minha própria vida.
me salvei me achando em você e depois me perdi, enlouqueci. me encontrei quando estive a passos de te perder. foi preciso que eu me achasse em mim pra só depois haver um "mim" em "mim", um "ti" em "ti", um "nós". do mundo não me livrarei, nem ele de mim, aprendi que só há uma salvação ao alcance da mão. não ouso dizer aqui, está em todas as bocas mas em poucos corações.